segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

HOMENS NÉSCIOS QUE ACUSAIS

Poema de Soror Juana Inés de la Cruz. 


[Tradução de Aílton de Souza e Jorge Luis Gutiérrez]


Homens néscios que acusais
a mulher sem razão, 
sem ver que sois a causa
do mesmo que culpais: 

se com ânsia sem igual
solicitais seu desdém, 
por que quereis que procedam bem
se as incitais ao mal? 

Combateis sua resistência
e logo, com gravidade, 
dizeis que é leviandade
o que fez a diligencia. 

Assemelhar-se quer a ousadia
de vosso parecer louco,
ao menino que faz uma mostro
e logo lhe tem medo. 

Quereis, com presunção néscia, 
encontrar à que procurais, 
para prometida, Thais, 
e para possuir, Lucrecia.

Que humor pode ser mais estranho
que aquele que, sem conselho,
ele próprio embaça o espelho,
e reclama que não está claro?

Com o favor e o desdém,
estás em igual condição,
queixando-se, se lhes tratam mal,
zombando, se lhes querem bem. 

Opinião, nenhuma ganha,
pois a que mais se recata,
se não vos admite, é ingrata,
e se vos admite, é leviana.

Sempre tão néscios andais
que, com desigual cota, 
a uma culpais por cruel
e a outra por fácil culpais. 

Pois como há de ser moderada
a que vosso amor pretende, 
se a que é ingrata, ofende, 
e a que é fácil, entedia? 

Mas, entre o tédio e a aflição
que vosso gosto insinua, 
bem haja a que não vos queira
e lamentai vos em hora idônea. 

Dão vossas queridas tristezas, 
a suas liberdades asas, 
e depois de torná-las más
quereis achá-las virtuosas. 

Qual maior culpa tem tido
em uma paixão errada: 
a que cai pelos rogos
ou quem roga por caído? 

Ou quem tem maior culpa, 
independente do mal que faza: 
a que peca por salario, 
ou quem para pecar paga? 

Pois, para que vos espantais
da culpa que tens?
quereis elas como as fazeis
ou fazei elas como as procurais.

Deixe de solicitar,
e depois, com mais razão,
acusareis a afeição
da que vos for a suplicar. 

Bem com muitas armas fundo
que luta vossa arrogância, 
pois em promessa e instancia
juntais diabo, carne e mundo. 

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